“Kalevala”, um importante livro finlandês escrito por Elias Lönnrot, um médico rural do séc. XIX, foi traduzido há poucos anos para português! Um tesouro para o seu povo, como os Lusíadas para nós. Uma epopeia que ilustra a cultura que originou os poemas.
Descobri-o, agora que procuro curiosidades sobre a Finlândia: palavras, paisagens e música…
Lá, nesse norte da Terra, na Lapónia Finlandesa, na linha imaginária à qual se deu o nome de Círculo Polar Ártico, ficarei muito próxima dos Gelos Eternos!!!… Nesse momento, sentirei Gratidão por me ter sido dada a oportunidade de contemplar a Vida daquela Natureza.
Partilho convosco um maravilhoso excerto do Canto I do longo poema épico Kalevala. Confesso que, quando li estas palavras, fui levada por um sonho até uma memória onde tudo isto me parecia real…:
“Canções que o meu pai cantava
ao talhar o cabo do machado;
canções que a mãe ensinava
ao passar a lã pelo fuso,
eu pequenino no chão
a ver o joelho mexer,
pobre babado de leite,
sujo de soro, pequeno.
Ao Sampo palavras sobravam,
a Louhi os sortilégios:
o Sampo envelheceu nas palavras
Louhi nos sortilégios sumiu,
Vipunen nos lais morreu,
Lemminkäinen em diabruras.
Há ainda outras palavras
são mágicas, da tradição:
nos caminhos recolhidas,
do meio da urze arrancadas,
dos galhos secos puxadas,
de árvores novas tiradas,
pelo feno afagadas,
dessas vielas rasgadas,
quando a pastorear seguia
com o gado nas pastagens,
na riqueza da turfeira,
pequenos montes dourados,
atrás da Muurikki negra,
da Kimmo de muitas cores.
Cantos o frio recitou,
a chuva poemas me disse.
Canções os ventos trouxeram,
outras as ondas do mar.
O planar das aves, palavras,
frases as copas das árvores.
Com elas o novelo fiz,
arranjadas enrolei.
No trenó pus o novelo,
no trenel novelo meti;
no trenó para casa o levei,
no trenel para o celeiro,
a um canto ali o deixei,
numa caixinha de cobre.
Semanas ao frio ficou,
por muito tempo o esqueci.
Tirarei do frio os cânticos,
do gelo as canções extraio,
para o lar a caixa levo,
sobre o banco a caixa deixo,
debaixo da trave mestra,
por baixo do belo tecto
abro a arca das palavras,
começo então a cantar,
o novelo a desenrolar,
os seus nós desatarei?
O canto bom cantarei,
canção tão bela que ecoe,
de comida do centeio
ou da cerveja do malte.
Se cerveja não houver,
o malte não me oferecerem,
com magra boca direi,
com água só cantarei
para a nossa noite alegrar,
para a luz do dia honrar,
para o prazer de amanhã
a manhã que ora começa.”